Diretor da Ubisoft revela: Assassin's Creed foi pensado como uma trilogia e terminaria com a morte de Desmond Miles, mas o sucesso mudou tudo.
Em um universo onde as franquias de games parecem ter um ciclo de vida infinito, uma revelação recente nos faz questionar toda a estrutura de uma das sagas mais icônicas da Ubisoft. Segundo Alex Hutchinson, diretor criativo de Assassin’s Creed 3, a jornada que acompanhamos por mais de uma década foi originalmente desenhada para ser um ecossistema narrativo fechado: uma trilogia. Em uma entrevista concedida ao portal FRVR e publicada na última quinta-feira (23), Hutchinson soltou a bomba: o plano inicial não apenas previa um fim, como esse fim seria drástico, culminando na morte de seu protagonista do tempo presente, Desmond Miles. A revelação lança uma nova luz sobre a trajetória da série e expõe a complexa diplomacia entre a visão criativa e as demandas de um mercado que pede por mais.
O Roteiro Original: Uma Conexão Direta com o Fim
Imagine um mundo onde a história de Assassin’s Creed tivesse um começo, meio e fim bem definidos. De acordo com Hutchinson, esse era o protocolo estabelecido pela própria Ubisoft, mesmo antes de sua chegada à equipe. A estrutura era clara: três jogos que construiriam uma ponte direta entre o passado e o presente. O clímax dessa arquitetura narrativa seria um terceiro jogo totalmente focado em Desmond, ambientado nos dias atuais, onde ele utilizaria todas as habilidades adquiridas através do Animus para concluir sua missão. “O 3º seria um jogo de Desmond e se passaria no presente, o que botaria um fim à franquia”, afirmou Hutchinson na entrevista. Esse desfecho não seria apenas o fim de uma saga, mas a conclusão lógica de um arco de personagem que começou como um simples barman e se transformou na peça central de uma guerra milenar. A morte de Desmond seria, nesse cenário, o sacrifício final para salvar a humanidade, fechando todas as pontas soltas e entregando uma mensagem poderosa sobre legado e propósito.
A Interrupção do Protocolo: Brotherhood e Revelations
Então, o que aconteceu com essa trilogia perfeitamente planejada? A resposta, como em muitos ecossistemas digitais, é uma palavra: sucesso. O desempenho comercial estrondoso de Assassin’s Creed 2 criou uma demanda tão grande que a Ubisoft viu uma oportunidade de expandir o universo antes de finalizá-lo. Foi nesse ponto que a rota original foi desviada. “O problema com o sucesso é que ele é prolongado”, explicou Hutchinson. “Então, a Ubisoft inseriu mais 2 jogos no meio antes que conseguíssemos encerrar a trama”. Os jogos em questão, Assassin’s Creed: Brotherhood e Assassin’s Creed: Revelations, nasceram dessa necessidade de estender a experiência. O diretor criativo revela que eles poderiam ter sido apenas DLCs, expansões da história de Ezio Auditore, mas a ambição comercial os transformou em títulos completos, experiências robustas que, embora aclamadas, acabaram funcionando como um desvio no caminho para a conclusão da história principal. Essa decisão, na prática, colocou a narrativa central de Desmond em modo de espera, um serviço rodando em segundo plano enquanto o foco se voltava para as aventuras de Ezio.
O Peso da Expansão: Quando a Trama se Desconecta
Para Alex Hutchinson, essa expansão não veio sem custos. Ao inserir dois capítulos inteiros naquilo que deveria ser uma ponte direta para o final, a história começou a sair de controle. Ele descreve que essa decisão “criou um peso enorme e tirou a série do caminho de sua narrativa histórica”. O que era para ser uma trama coesa e interligada começou a se fragmentar, adicionando camadas e mais camadas de lore que, embora ricas, complicaram o objetivo final. É um dilema clássico: como manter a integridade de um ecossistema narrativo quando ele precisa escalar de forma não planejada? Hutchinson acredita que é exatamente nesse ponto que grandes histórias perdem o rumo e começam a desagradar os fãs mais antigos. “Se você observar a morte de franquias e gêneros, isso ocorre quando eles começam a desaparecer com suas nuances”, pontuou. A saga de Desmond, que deveria ser o fio condutor, acabou se tornando apenas mais uma parte de um universo em constante e, por vezes, desordenada expansão. Será que a busca por mais conteúdo inevitavelmente sobrecarrega a API original de uma história?
Um Legado de 'E Se?': O Assassin's Creed que Poderíamos Ter Tido
Hoje, com a franquia Assassin's Creed seguindo por caminhos de RPG massivos e explorando mitologias diversas, a revelação de Hutchinson soa quase como um eco de um universo paralelo. A ideia de um final definitivo e planejado para Desmond Miles em 2012 contrasta fortemente com a natureza “infinita” da série atual. A declaração do ex-diretor, que hoje trabalha em Revenge of the Savage Planet, nos deixa com uma pergunta fundamental: a franquia seria mais forte se tivesse seguido seu roteiro original e se encerrado como uma trilogia coesa? Ou o sucesso que a transformou em um fenômeno global justifica a diluição de sua trama inicial? Não há uma resposta fácil, mas a história por trás da história nos oferece uma visão fascinante sobre os bastidores da indústria de games, onde a arte da narrativa e a ciência do mercado estão em um diálogo constante e, por vezes, conflituoso. O legado de Desmond, no fim das contas, não é apenas o que vimos nos jogos, mas também o do grande 'e se' que ele representa.
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