A Meta compra a startup do pingente de IA que grava tudo
Em um movimento que parece ter sido tirado de um episódio de “Black Mirror”, a Meta anunciou na última sexta-feira a aquisição da Limitless, a startup de IA que antes atendia pelo nome de Rewind. A notícia, confirmada em comunicado no site da própria empresa e reportada pelo TechCrunch, marca o fim da jornada independente da companhia que prometia uma “supermemória” na forma de um pingente de US$ 99 capaz de gravar todas as suas conversas. Agora, a equipe por trás dessa tecnologia se juntará à divisão Reality Labs da Meta, o que nos leva a uma pergunta inevitável: estamos prestes a viver em um mundo onde nossos óculos da Meta não apenas veem, mas também ouvem e lembram de tudo por nós?
Um Cérebro Externo Pendurado no Pescoço
Para quem não acompanhou a ascensão meteórica da Limitless, a premissa era tão simples quanto audaciosa. A empresa, fundada por Dan Siroker e Brett Bejcek, desenvolveu o Limitless Pendant, um pequeno dispositivo vestível que poderia ser preso à roupa ou usado como colar. Conforme detalhado em uma reportagem do The Verge, seu objetivo inicial era focado em resolver um problema corporativo: as reuniões. O pingente gravava o áudio, transcrevia, criava notas e resumia os pontos principais, atuando como um secretário particular incansável.
Com uma bateria que, segundo a empresa, durava 100 horas, o aparelho usava tecnologia de beam-forming para focar em quem estava falando e isolar ruídos de fundo. Uma luz de LED indicava quando a gravação estava ativa, uma tentativa de transparência em um conceito inerentemente polêmico. A Limitless chegou a criar um “Modo de Consentimento” que detectava novas vozes e só iniciava a gravação após ouvir um consentimento verbal. Curiosamente, como apontou o The Verge, esse modo vinha desativado por padrão, deixando a responsabilidade nas mãos do usuário.
A visão de Dan Siroker, no entanto, ia muito além de otimizar reuniões. O plano era criar um ecossistema que, alimentado por nossas conversas, e-mails e calendários, se tornaria uma inteligência artificial proativa, capaz de redigir respostas e nos preparar para interações futuras. Era o sonho de um assistente pessoal onisciente, uma espécie de Jarvis da vida real, um passo em direção ao futuro explorado no filme que inspirou o nome da empresa, “Limitless”.
Quando o Sonho Independente Encontra a Realidade dos Titãs
Então, por que vender? Em seu comunicado, Siroker foi sincero sobre o cenário atual. “Quando começamos a Limitless cinco anos atrás, o mundo era muito diferente”, escreveu ele. “Hoje... não estamos mais trabalhando em uma ideia estranha e marginal. Estamos construindo um futuro que agora parece inevitável. Não estamos sozinhos.” A verdade é que o campo dos wearables de IA se tornou um campo de batalha para gigantes. Com OpenAI, Meta e outras Big Techs desenvolvendo seus próprios hardwares, competir se tornou uma missão quase impossível para uma startup, mesmo uma que já havia levantado mais de US$ 33 milhões de investidores de peso como a16z e NEA, segundo o TechCrunch.
Com a aquisição, a Limitless anunciou o encerramento da venda de seus dispositivos. Os clientes existentes terão suporte por mais um ano, e a taxa de assinatura foi suspensa, movendo todos para o plano ilimitado. O software original, “Rewind”, que gravava a atividade na tela do desktop, também será descontinuado. A empresa garantiu que os usuários poderão exportar ou deletar seus dados, fechando um capítulo de sua história como uma entidade independente.
Reality Labs: Onde a Ficção Científica Vira Produto
A equipe da Limitless agora se junta à organização de wearables do Reality Labs, o coração pulsante das ambições de hardware da Meta. Em um comunicado enviado ao TechCrunch, a Meta afirmou: “Estamos empolgados que a Limitless se junte à Meta para ajudar a acelerar nosso trabalho na construção de wearables habilitados para IA”. Isso praticamente confirma que a tecnologia e o talento da Limitless não serão engavetados, mas sim integrados em produtos futuros.
Aqui é onde a especulação futurista começa. A Meta já tem os óculos Ray-Ban Meta, que tiram fotos e fazem vídeos. Imagine a próxima geração desses óculos com a capacidade de gravação de áudio contínua e a inteligência da Limitless. Suas conversas no café, suas reuniões de trabalho, seus jantares em família — tudo poderia ser capturado, analisado e transformado em dados acionáveis. Seria o fim do “esqueci o que você disse” e o início de um arquivo de vida perfeitamente pesquisável.
A aquisição não é apenas sobre comprar uma empresa de hardware; é sobre adquirir uma peça fundamental para a construção da “superinteligência pessoal” que a Limitless vislumbrava. A Meta, com seu vasto ecossistema de dados sociais, está na posição perfeita para conectar o que dizemos com o que postamos, quem conhecemos e o que compramos, criando um perfil nosso mais completo do que qualquer coisa que já vimos.
A compra da Limitless pela Meta é mais do que uma simples transação corporativa; é um manifesto sobre o futuro da computação pessoal e da inteligência artificial. Estamos nos movendo rapidamente de uma interação reativa com a tecnologia para uma era de assistência proativa e onipresente. O fim do pingente Limitless como um produto independente é, na verdade, o início de sua ideologia dentro de um dos maiores ecossistemas de dados do planeta. A questão que fica no ar, ecoando como uma conversa gravada, é: quando nossa memória se tornar um serviço na nuvem de uma Big Tech, quem realmente terá o controle sobre o nosso passado? O futuro chegou, e ele está ouvindo.
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