Uma Peça de Arqueologia Digital Agora em Mãos Públicas

Em um anúncio que fez o coração de muitos veteranos da computação bater mais forte, a Microsoft oficializou a liberação do código-fonte dos icônicos jogos Zork I, Zork II e Zork III. A revelação, feita pelo chefão de desenvolvimento da Microsoft, Scott Hanselman, durante o evento Ignite, coloca esses pilares da história dos games sob a licença MIT. Isso significa que, a partir de agora, qualquer pessoa pode estudar, modificar e, claro, se aventurar pelos labirintos que definiram o gênero de aventura em texto no final dos anos 70 e início dos 80.

A iniciativa é um esforço conjunto que envolveu as equipes do Xbox, da Activision (adquirida pela Microsoft em 2023) e do Escritório de Programas de Código Aberto da Microsoft. Segundo o comunicado de Hanselman e Stacey Haffner, Diretora do escritório, o objetivo é simples: “colocar código historicamente importante nas mãos de estudantes, professores e desenvolvedores para que possam estudá-lo, aprender com ele e, talvez o mais importante, jogá-lo.”

A Saga de Zork e a Mágica da Z-Machine

Para quem não estava lá para testemunhar, é difícil explicar o impacto de Zork. Inspirado pelo pioneiro Colossal Cave Adventure, Zork foi um salto monumental na interação com jogos. Em vez de comandos simples como "go north", os jogadores podiam usar uma linguagem mais natural, como "climb up the tree", o que, para a época, era pura feitiçaria. Originalmente desenvolvido para o robusto computador PDP-10, o jogo era tão vasto que a Infocom, empresa fundada pelos desenvolvedores originais, precisou dividi-lo em três partes para que coubesse nos computadores pessoais da época.

O verdadeiro segredo do sucesso e da onipresença da Infocom, no entanto, era uma tecnologia engenhosa chamada Z-machine. Conforme detalhado por publicações como o The Register, os jogos eram escritos na Zork Implementation Language (ZIL) e rodavam nessa máquina virtual. Isso significa que, para levar Zork a um novo sistema, bastava portar a Z-machine, e não o jogo inteiro. Era a "engine" universal da época, muito antes de a Unity ou a Unreal sonharem em existir, permitindo que os jogos da Infocom estivessem em praticamente todas as plataformas imagináveis.

Um Código que Já Estava Entre Nós

Curiosamente, esta não é a primeira vez que o código-fonte de Zork vê a luz do dia. De acordo com o TabNews, o arquivista digital Jason Scott, do Internet Archive, já havia enviado os arquivos para o GitHub em 2019. Contudo, a questão da licença permanecia em um limbo jurídico. Com a aquisição da Activision pela Microsoft, a gigante da tecnologia pôde finalmente oficializar a situação, trabalhando com Scott para garantir que o código fosse liberado sob a permissiva licença MIT, dando segurança para que a comunidade possa de fato utilizá-lo sem preocupações.

É importante notar que a licença cobre exclusivamente o código-fonte. Elementos como as embalagens comerciais, materiais de marketing e as marcas registradas continuam sendo propriedade da Microsoft. Os repositórios oficiais já estão disponíveis para os curiosos e corajosos:

Prepare a Lanterna e Cuidado com o Grue

Com o código em mãos, a comunidade já tem as ferramentas para compilá-lo e reviver as aventuras. O anúncio sugere o uso do compilador ZILF (ZIL Forever) para transformar o código-fonte em um arquivo Z3 executável, que pode ser rodado em interpretadores modernos como o Windows Frotz. Este redator até tentou compilar o código para este artigo, mas a pesquisa se estendeu... digamos que o perigo de ser devorado por um grue é real e uma ótima desculpa para prazos perdidos. A piada, claro, é um clássico para quem já se aventurou por essas masmorras escuras.

A decisão da Microsoft é mais do que um simples ato de nostalgia. É um movimento fundamental para a preservação da história do software, garantindo que uma das obras mais influentes da indústria dos games não se perca no tempo. Ao abrir o código, a empresa oferece um material de estudo riquíssimo, permitindo que uma nova geração de desenvolvedores entenda como narrativas complexas e mundos imersivos eram construídos com recursos computacionais extremamente limitados. É a prova de que, mesmo décadas depois, os velhos códigos ainda têm muito a ensinar.