Um Fantasma Atômico Ressurge Para a Era da IA
Na história da tecnologia, algumas relíquias são tratadas com a reverência de um artefato arqueológico. Mainframes que rodam sistemas bancários há 50 anos, códigos em COBOL que se recusam a morrer... e, ao que parece, usinas nucleares com um passado notório. Em uma decisão que parece roteiro de filme, o governo dos EUA anunciou um empréstimo de US$ 1 bilhão para a Constellation Energy com um objetivo claro: reativar o reator Unidade 1 da usina de Three Mile Island.
A instalação, localizada na Pensilvânia, é mais conhecida pelo acidente de 1979 com sua irmã, a Unidade 2, que sofreu um derretimento parcial do núcleo e marcou para sempre a percepção pública sobre a energia atômica. A Unidade 1, no entanto, operou até 2019, quando foi desativada. Agora, a fome insaciável da Inteligência Artificial por eletricidade está trazendo este gigante adormecido de volta à vida. É a prova de que, na tecnologia, assim como em alguns filmes, os clássicos controversos nunca morrem de verdade. Apenas ficam... em standby.
De Volta Para o Futuro: Um Acordo Bilionário
O anúncio foi feito pelo Secretário de Energia dos EUA, Chris Wright, que destacou que o financiamento, vindo do Loan Programs Office do Departamento de Energia (DOE), visa reduzir os custos da eletricidade e fortalecer a confiabilidade da rede elétrica. Segundo Wright, a reativação da usina, agora rebatizada como Crane Clean Energy Center, não é apenas sobre energia. “Ela também ajudará a garantir que a América tenha a energia de que precisa para crescer sua base de manufatura doméstica e vencer a corrida da IA”, afirmou o secretário, em uma clara referência à competição com a China.
A iniciativa faz parte de um movimento maior da administração Trump para garantir a soberania energética e tecnológica. Conforme relatado pelo The Register, a medida reflete a urgência em atender a uma demanda que cresce exponencialmente, impulsionada pelos data centers que treinam e operam modelos de IA cada vez mais complexos.
O Apetite Voraz da Microsoft (e Seus Amigos)
Mas para onde irá toda essa energia? Uma parte significativa já tem destino certo. Em setembro de 2024, a Microsoft, uma das maiores protagonistas na corrida da IA, assinou um contrato de compra de energia de 20 anos (PPA - Power Purchase Agreement) com a Constellation. O acordo garante que a gigante da tecnologia terá uma fonte de energia limpa e constante para descarbonizar as operações de seus data centers.
A jogada da Microsoft é um indicativo poderoso. Empresas de tecnologia, que antes lideravam a busca por fontes renováveis como solar e eólica, agora olham para a energia nuclear como uma solução estável e potente, capaz de fornecer a carga de base necessária 24 horas por dia, 7 dias por semana, algo que as renováveis intermitentes ainda não conseguem garantir sozinhas. A demanda é tão grande que, segundo o The Register, a OpenAI chegou a pedir ao presidente a construção de 100 gigawatts de capacidade de geração adicional por ano para não perder o passo para a China.
Um Gigante de 835 MW e Um Passado Sombrio
A reativação da Unidade 1 de Three Mile Island é uma solução pragmática. O reator de 835 megawatts tem capacidade para gerar energia suficiente para abastecer aproximadamente 800.000 residências, pendendo apenas da aprovação final da Comissão Reguladora Nuclear. Para a indústria de tecnologia, essa é uma quantidade imensa de energia pronta para ser consumida.
A grande vantagem, segundo os especialistas, é a velocidade. Construir uma usina nuclear do zero pode levar até uma década. Reiniciar uma unidade que foi apenas desativada, mas não totalmente descomissionada, é um atalho valioso. Joe Dominguez, CEO da Constellation, chegou a sugerir que a usina poderia estar online um ano antes do previsto, talvez já em 2027, pronta para se conectar à rede regional que atende Pensilvânia, Nova Jersey e Maryland. A pressa é, literalmente, inimiga da espera.
A Energia Nuclear Como Pilar da Revolução da IA
O caso de Three Mile Island não é isolado. Ele representa uma tendência global em que a energia nuclear está sendo reavaliada como uma fonte essencial para sustentar a próxima revolução industrial, a da Inteligência Artificial. A decisão do governo dos EUA de investir pesado na reativação de uma usina tão simbólica envia uma mensagem clara: para alimentar o futuro digital, todas as opções estão na mesa, inclusive aquelas que um dia foram o epicentro do medo e da controvérsia. O futuro da IA, ao que tudo indica, terá um brilho atômico.
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