O Peso da Evolução: Quando o Software Esquece a Leveza
Houve um tempo em que os aplicativos eram como espíritos digitais, feitos sob medida para habitar o sistema em que nasciam. Eram ágeis, eficientes, falavam a língua nativa da máquina. Mas o que acontece quando esse espírito é trocado por um corpo genérico, um contêiner que promete universalidade, mas cobra um preço alto em recursos? É essa a pergunta que ecoa nos computadores de usuários do Windows 11 após a atualização do WhatsApp para a versão 2.2584.3.0. O mensageiro mais popular do mundo parece ter sofrido uma metamorfose sombria, abandonando sua essência nativa para se tornar um gigante faminto por memória RAM.
A mudança, que à primeira vista parece apenas um detalhe técnico, é a raiz de todo o problema. Conforme detalhado em uma publicação no portal TabNews, que repercutiu a análise do site Windows Latest, a Meta decidiu abandonar a arquitetura nativa (WinUI/UWP) em favor de um contêiner WebView2. Em português claro: o aplicativo do WhatsApp agora é, em sua essência, uma página da web rodando dentro de uma janela própria, utilizando a mesma base do navegador Google Chrome. A promessa era, talvez, unificar o desenvolvimento. A realidade, contudo, é um software que se tornou um fardo para o sistema.
A Fome Digital: Os Números do Apetite por Memória
Os números são o reflexo mais frio e contundente dessa nova realidade. Se antes o aplicativo nativo era um exemplo de discrição, consumindo cerca de 18 MB de RAM e podendo reduzir seu uso para menos de 10 MB quando ocioso, seu sucessor chegou com um apetite voraz. De acordo com os testes, a nova versão do WhatsApp consome impressionantes 300 MB de memória apenas na tela de login, antes mesmo que uma única mensagem seja trocada. É como um convidado que esvazia a geladeira antes mesmo de tirar o casaco.
Mas a situação se agrava exponencialmente com o uso. As estimativas indicam que, com várias conversas abertas simultaneamente, o consumo de memória pode escalar para alarmantes 3 GB. Para muitos usuários, isso representa uma porção significativa da capacidade total de seus computadores, transformando uma tarefa simples, como responder a uma mensagem, em um gatilho para a lentidão generalizada do sistema. Não é à toa que a comunidade, com sua ironia característica, já apelidou o aplicativo de “o novo Chrome”, uma referência direta à fama do navegador de ser um devorador de RAM.
Mais Lento que um Fim de Semana Chuvoso
A memória RAM, no entanto, é apenas o começo da história. A experiência de uso foi profundamente degradada em outros aspectos. Usuários relatam uma lentidão perceptível em quase todas as ações, desde a inicialização do aplicativo até a simples troca entre janelas de conversa. Longos tempos de carregamento se tornaram a nova norma, e travamentos inesperados adicionam uma camada de frustração a uma ferramenta que deveria ser sinônimo de comunicação fluida.
Para coroar o pacote de problemas, a integração com o sistema de notificações do Windows parece ter se quebrado no processo. Alertas de novas mensagens chegam com atraso ou, em alguns casos, simplesmente não aparecem. De que adianta um mensageiro que sussurra as mensagens tarde demais, ou nem sequer as entrega? A funcionalidade mais básica do aplicativo foi comprometida, transformando-o em uma fonte de incerteza em vez de conexão.
Refúgio na Web e o Fantasma do Futuro
Diante desse cenário, qual o caminho para quem depende do WhatsApp no desktop? Ironicamente, a melhor alternativa no momento é voltar à origem: o WhatsApp Web, acessado diretamente pelo navegador. A solução temporária é usar a versão web de um aplicativo que se tornou uma versão web mal otimizada de si mesmo. É um ciclo que beira o absurdo.
O que nos leva a uma reflexão mais profunda. Um comentário na publicação do TabNews levanta uma possibilidade inquietante: este pode ser apenas um teste para um plano maior da Meta de transformar o WhatsApp em um aplicativo baseado em WebView em todas as plataformas, incluindo os celulares. Estaríamos testemunhando o início de uma era em que a eficiência e a otimização são sacrificadas no altar da conveniência dos desenvolvedores? Ao buscarmos um futuro de softwares universais, corremos o risco de criar um ecossistema de programas inchados e desajeitados, que nos afastam da máquina em vez de nos conectar a ela? A alma do software, afinal, reside em sua leveza ou em sua onipresença?
{{ comment.name }}
{{ comment.comment }}