Microsoft na Mira da Justiça por Venda Casada de IA

Parece que a febre da inteligência artificial pode ter subido à cabeça da Microsoft, e agora a conta chegou na forma de um processo judicial. A Comissão Australiana de Concorrência e Consumidor (ACCC) está processando a gigante da tecnologia por supostamente enganar 2,7 milhões de australianos, fazendo-os pagar por uma atualização para o assistente de IA Copilot em suas assinaturas do Microsoft 365. A acusação é direta: a empresa teria escondido deliberadamente a opção de continuar com os planos antigos e mais baratos, levando os consumidores a acreditar que a única saída para manter o serviço ativo era desembolsar mais dinheiro.

A Atualização Obrigatória que Ninguém Pediu

A lógica do consumidor é simples: se você tem uma assinatura e a data de renovação chega, você espera poder continuar com o mesmo plano. A Microsoft, no entanto, parece ter operado com uma lógica diferente. De acordo com a ACCC, após a integração do Copilot ao Microsoft 365 na Austrália em 31 de outubro de 2024, os assinantes existentes começaram a receber mensagens de renovação que, convenientemente, omitiam uma informação fundamental: a possibilidade de manter o plano original, sem Copilot e sem aumento de preço.

O resultado dessa omissão foi um aumento de preço nada sutil. Para os assinantes do plano Microsoft 365 Personal, o reajuste chegou a 45%. Já para os usuários do plano Microsoft 365 Family, o aumento foi de 29%. Basicamente, a escolha apresentada era: ou você paga mais caro pelo nosso novo assistente de IA, ou... bem, a outra opção não era claramente apresentada.

Onde Estava a Opção Mais Barata?

Aqui a história fica ainda mais interessante, quase como um quebra-cabeça projetado para o fracasso do consumidor. Segundo a investigação da ACCC, a única maneira de um cliente descobrir que poderia continuar com seu plano antigo era iniciando o processo de cancelamento do serviço. Isso mesmo. Para não ser forçado a pagar mais, o usuário precisaria clicar no botão que, em qualquer outro cenário, significaria o fim de seu relacionamento com o produto. A ACCC argumenta, com razão, que uma pessoa interessada em continuar usando o Microsoft 365 não pensaria em clicar em 'cancelar' como um caminho para a renovação.

Se um usuário decidisse continuar, então a única opção visível era o upgrade. Se, por outro lado, ele iniciasse o cancelamento, só então a opção de manter o plano antigo aparecia. É uma prática que especialistas em design de interface chamam de "dark pattern", ou padrão sombrio, projetada para induzir o usuário a tomar uma decisão que ele não tomaria se tivesse todas as informações claras.

A Lógica da Lei vs. a Lógica do Marketing

Para a ACCC, a conduta da Microsoft não é apenas uma questão de má fé, mas uma violação direta de várias seções da Lei do Consumidor Australiana. O órgão regulador alega que a empresa infringiu as seguintes seções:

  • Seção 18: Conduta enganosa ou que possa enganar.
  • Seção 29(1)(i): Falsas ou enganosas representações sobre o preço de bens ou serviços.
  • Seção 29(1)(l): Falsas ou enganosas representações sobre a necessidade de bens ou serviços.
  • Seção 29(1)(m): Falsas ou enganosas representações sobre a existência ou efeito de uma condição ou direito.

Com base nessas alegações, a ACCC está buscando no Tribunal Federal da Austrália a imposição de penalidades civis, ordens para impedir que a Microsoft repita a conduta e, o mais importante para os 2,7 milhões de afetados, uma ordem de compensação financeira.

Questionada pelo BleepingComputer, a Microsoft emitiu a resposta padrão de relações públicas: "A confiança e a transparência do consumidor são as principais prioridades da Microsoft, e estamos analisando a alegação da ACCC em detalhes". Considerando que a estratégia de comunicação para o lançamento do Copilot foi similar em todo o mundo, a grande questão agora é se outros países seguirão o exemplo australiano e colocarão a lógica de vendas da Microsoft sob o microscópio legal.