A Orquestra Desafinada de Bruxelas
Em um movimento coordenado que surpreendeu um total de zero pessoas, Apple e Google subiram o tom contra a União Europeia, classificando a ambiciosa Lei dos Mercados Digitais (DMA) como um experimento fracassado. Em comunicados oficiais divulgados em setembro de 2025, as duas maiores forças da tecnologia mundial argumentaram que a legislação, criada para fomentar a concorrência, está, na verdade, prejudicando a segurança dos usuários, a experiência de uso e, principalmente, colocando a Europa no fim da fila para receber as inovações em Inteligência Artificial. A briga está longe de ser apenas técnica; é um embate fundamental sobre o futuro da regulação digital no planeta.
O Grito da Maçã: Inovação Acorrentada
A Apple, em um post detalhado, não mediu palavras para descrever sua frustração. A empresa de Cupertino afirmou que a Lei dos Mercados Digitais (DMA) a está "forçando a fazer algumas mudanças preocupantes" em seus produtos. Segundo a companhia, essas mudanças não apenas falham em beneficiar a economia europeia, como também representam um retrocesso para os consumidores. Recursos como a tradução de conversas em tempo real nos AirPods, o armazenamento de locais favoritos no Apple Maps e o espelhamento da tela do iPhone em Macs estão sendo adiados no continente.
O motivo? A Apple alega que suas propostas de adaptação foram rejeitadas pela Comissão Europeia, que exigiu que tais funcionalidades fossem estendidas para produtos de outras empresas. Além disso, a gigante ressuscitou seus argumentos clássicos sobre segurança, afirmando que a abertura forçada de seu ecossistema a lojas de aplicativos de terceiros e sistemas de pagamento alternativos expõe os usuários a "riscos muito maiores de vigilância e rastreamento". Com um toque de ironia, a empresa também questionou por que foi singularmente regulada, enquanto a Samsung, segundo eles, é a vendedora dominante de smartphones na Europa. O resultado, para a Apple, é claro: a conformidade com a DMA está freando sua capacidade de inovar.
Google Ecoa as Queixas: IA Atrasada e Preços Maiores
No dia seguinte, foi a vez do Google engrossar o coro. Em seu próprio comunicado, a empresa afirmou que a DMA "está causando danos significativos e não intencionais aos usuários europeus e a muitas das pequenas empresas que deveria proteger". Oliver Bethell, Diretor Sênior de Competição do Google, foi direto ao ponto: a lei obriga a Busca Google a parar de exibir resultados úteis de viagens que levam diretamente a sites de companhias aéreas e hotéis. Em vez disso, o buscador precisa mostrar links de sites intermediários "que cobram pela inclusão". Na prática, segundo Bethell, isso aumenta os preços para os consumidores e favorece um pequeno grupo de intermediários em detrimento da maioria das empresas.
Mas o golpe mais sentido para o público europeu foi o anúncio de que os novos recursos de Inteligência Artificial do Google chegarão à Europa "até um ano depois de serem lançados no resto do mundo". Bethell declarou que "esse atraso prejudica os consumidores e as empresas europeias que merecem acesso à mais recente e melhor tecnologia". O apelo do Google é para que a futura aplicação da lei seja baseada em fatos, consistente e focada no usuário, e não nos interesses de poucos.
O Palco da Batalha: Uma Lei Sob Revisão
As críticas de Apple e Google não surgiram do vácuo. Elas foram estrategicamente publicadas durante o período de revisão da DMA, iniciado pela Comissão Europeia em julho, cujo prazo para submissões se encerrou em 24 de setembro. Este é o momento em que as corporações podem, oficialmente, apresentar suas queixas e tentar influenciar os próximos passos dos reguladores. É um jogo de pressão pública e diplomacia de bastidores que definirá as regras para os próximos anos. A expectativa é que outras gigantes da tecnologia também tenham apresentado suas opiniões, e que o governo dos EUA, especialmente sob uma administração que vê a regulação de empresas americanas como prejudicial, esteja observando a situação com grande interesse.
Um Futuro em compasso de espera
O que se desenha no horizonte é um impasse de proporções colossais. De um lado, gigantes tecnológicas que construíram ecossistemas fechados e altamente lucrativos argumentam que a regulação excessiva destrói a inovação e a segurança. Do outro, reguladores europeus determinados a quebrar o que consideram um monopólio digital e a criar um mercado mais justo. No meio disso tudo, milhões de usuários europeus que podem acabar esperando meses, ou até um ano, por tecnologias que o resto do mundo já estará usando. A saga da Lei dos Mercados Digitais está apenas começando, e seus desdobramentos prometem redefinir a relação entre tecnologia e poder no cenário global.
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