Microsoft Constrói Supercomputador de IA no Cemitério de Promessas da Foxconn

A Microsoft anunciou oficialmente seus planos para construir o que chama de “o maior datacenter do mundo” em Mount Pleasant, Wisconsin. O projeto, que totaliza um investimento de US$ 7,3 bilhões, ocupará o terreno que ficou famoso por abrigar as promessas não cumpridas da Foxconn. Segundo a empresa, a nova estrutura será dez vezes mais rápida que o supercomputador mais potente da atualidade e tem previsão para entrar em operação no início de 2026, com o objetivo de acelerar massivamente os esforços de treinamento de Inteligência Artificial da gigante de Redmond.

Um Déjà Vu de Bilhões de Dólares?

Se você acompanha o mundo da tecnologia, a menção de um projeto grandioso em Mount Pleasant, Wisconsin, provavelmente dispara um alarme. A lógica é simples: já vimos esse filme antes. Em 2017, a Foxconn, fabricante taiwanesa, anunciou um campus tecnológico no local. O então presidente Trump chegou a classificá-lo como a “oitava maravilha do mundo”, e o estado de Wisconsin concedeu US$ 3 bilhões em subsídios para viabilizar o que parecia ser um sonho. A promessa inicial era de 30.000 empregos, um número que foi posteriormente reduzido para 13.000.

O resultado, no entanto, foi um fiasco. Ao final do processo, apenas 281 empregos foram efetivamente criados, e o projeto foi abandonado, deixando para trás um rastro de frustração e um terreno fértil para o ceticismo. Agora, a Microsoft assume o protagonismo. Brad Smith, presidente da empresa e alguém que, segundo ele, entregou jornais de bicicleta na cidade durante a infância, afirma que a iniciativa ajudará a “definir o futuro da inovação americana”. A questão que fica é: se a promessa anterior resultou em um erro de arredondamento, então qual a garantia de que o desfecho agora será diferente?

Anatomia de um Colosso: A Promessa da Microsoft

Para diferenciar seu projeto, a Microsoft aposta em números superlativos. De acordo com o CEO Satya Nadella, o complexo de data centers Fairwater abrigará “centenas de milhares” de GPUs Nvidia GB200. A infraestrutura de conexão será composta por uma quantidade de fibra óptica suficiente para dar 4,5 voltas ao redor do planeta Terra. O investimento original de US$ 3,3 bilhões foi, segundo o comunicado, mais do que dobrado com a adição de um segundo datacenter de US$ 4 bilhões no mesmo local.

Em termos de capital humano, a promessa é mais contida, mas ainda significativa: cerca de 3.000 trabalhadores podem ser empregados durante a fase de construção, com a necessidade de 800 funcionários em tempo integral para manter as instalações operando. A Microsoft parece ter aprendido a lição da Foxconn: se você vai prometer, então é melhor apresentar números que, embora impressionantes, pareçam minimamente ancorados na realidade.

O Dilema Energético: IA Verde ou Cortina de Fumaça?

Uma das maiores preocupações em torno de datacenters dessa escala é o seu impacto ambiental, especialmente o consumo de água e energia. A Microsoft antecipou as críticas e apresentou suas credenciais de sustentabilidade. A empresa afirma que mais de 90% do espaço será resfriado por um sistema de refrigeração líquida em circuito fechado. Segundo Scott Guthrie, vice-presidente executivo de Nuvem e IA, o sistema precisa ser preenchido apenas uma vez, eliminando a perda de água por evaporação e reduzindo o consumo a um volume equivalente ao uso anual de um restaurante americano. Para a energia, a Microsoft está construindo uma fazenda solar de 250 MW para, segundo a empresa, compensar cada quilowatt-hora consumido de fontes fósseis.

A lógica parece sólida, mas nem todos estão convencidos. A organização ambientalista Clean Wisconsin publicou uma análise que lança uma sombra sobre essas promessas. De acordo com o grupo, o campus da Microsoft, em conjunto com outro datacenter próximo, consumirá energia suficiente para abastecer 4,33 milhões de residências. O detalhe forense aqui é que o estado de Wisconsin possui apenas 2,8 milhões de lares. Se os dados da Clean Wisconsin estiverem corretos, então a matemática da sustentabilidade da Microsoft parece, no mínimo, otimista demais.

No fim das contas, o projeto em Wisconsin é um teste lógico para a Microsoft. De um lado, temos promessas de poder computacional sem precedentes e um design ecologicamente consciente. Do outro, o histórico sombrio do local e questionamentos válidos sobre o real impacto ambiental. A resposta para saber se a Microsoft conseguirá finalmente “desbugar” a reputação de Mount Pleasant, ou se apenas adicionará mais um capítulo ao seu legado de promessas corporativas, só virá em 2026. Por enquanto, a variável permanece indefinida.