Análise Lógica da Nova MP dos Data Centers
Finalmente, a saga da Medida Provisória (MP) dos Data Centers chegou a uma conclusão. Após uma longa espera que testou a paciência do setor de tecnologia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou, no dia 17 de setembro de 2025, a aguardada Política Nacional de Data Centers. A proposta, que será detalhada no Diário Oficial, funciona sob uma lógica binária simples: se as empresas quiserem um generoso pacote de desoneração fiscal para construir e equipar seus centros de dados no país, então deverão cumprir uma lista rigorosa de contrapartidas. A meta declarada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) é destravar investimentos na ordem de R$ 2 trilhões ao longo de 10 anos.
A Lógica do 'Toma Lá, Dá Cá' Tributário
Vamos dissecar a proposta. A principal promessa do governo, e o ponto mais celebrado pelo mercado, é a desoneração de impostos. Segundo o texto, a MP zera os impostos de importação para equipamentos que não possuem fabricação similar no Brasil. Além disso, isenta a compra de equipamentos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), do PIS e da Cofins. Na prática, o governo está antecipando os efeitos da reforma tributária, prevista para 2027, para um setor considerado estratégico.
Contudo, não existe almoço grátis no universo da política econômica. Se uma empresa deseja acessar esses benefícios, então ela precisa se comprometer com três condições bem definidas. A primeira é a obrigação de investir 2% de seus aportes em atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) dentro das cadeias produtivas digitais brasileiras. A segunda é que ao menos 10% dos serviços oferecidos por esses novos data centers deverão ser reservados para o mercado interno. A terceira, e não menos importante, é o cumprimento de rigorosas exigências de sustentabilidade, o que inclui o uso de energia de fontes renováveis ou limpas e a implementação de medidas de eficiência hídrica. A lógica é clara: o benefício fiscal é um meio, não um fim.
Soberania Digital ou Corrida por Servidores?
O objetivo do governo vai além de simplesmente atrair capital. Conforme declarado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a medida visa evitar um déficit no comércio de serviços e, fundamentalmente, garantir a segurança no processamento de dados em território nacional. A ideia é que informações sensíveis de “empresas brasileiras, de hospitais, do SUS, de universidades” sejam armazenadas e processadas aqui, reduzindo a dependência de infraestrutura estrangeira. A fonte menciona que o setor brasileiro fica frequentemente refém de ações externas ou de quedas de sistemas, o que impacta diretamente o país.
Essa movimentação também tem um forte componente geopolítico. O plano é estabelecer regras rapidamente para competir de forma mais agressiva com vizinhos como Chile e Colômbia, que já avançaram na atração desses investimentos na América do Sul, e também com potências como a Índia. Atualmente, o mercado é dominado por Estados Unidos e China, e o Brasil busca se posicionar como um player relevante. Para Renan Lima Alves, da Associação Brasileira de Data Center (ABDC), a iniciativa “terá reflexos diretos na economia nacional, com geração de empregos qualificados, fortalecimento da cadeia de fornecedores e expansão da infraestrutura digital”.
Uma Medida Cozinhada em Fogo Lento
O caminho até a assinatura da MP foi longo e sinuoso. O texto estava pronto desde o final de maio, mas sua publicação foi adiada por crises no cenário político e econômico, como o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e as tensões comerciais com os Estados Unidos. Essa demora, segundo a apuração do NeoFeed, gerou ceticismo no setor tecnológico, que chegou a duvidar da implementação da política.
Apesar dos atrasos, a construção da medida foi colaborativa. O governo federal, por meio de interlocutores como Uallace Moreira Lima do MDIC e Igor Marchesini Ferreira do Ministério da Fazenda, manteve um diálogo constante com o setor privado desde 2023. Affonso Nina, presidente da Brasscom, confirmou essa abordagem ao afirmar que foi “uma construção, começamos com uma folha em branco”. Ele também destacou um ponto importante: “além da importação de equipamentos, a MP também estimula a indústria nacional”.
O Veredito: Verdadeiro Potencial, Execução a Conferir
A publicação da Política Nacional de Data Centers é, sem dúvida, um passo significativo. A estrutura lógica de oferecer incentivos em troca de desenvolvimento local e sustentabilidade parece sólida no papel. Como resumiu o advogado Bruno Amatuzzi, especialista na área, a MP “torna o Brasil mais competitivo no mapa global de destinos de data centers”, potencializando vantagens que o país já possui, como energia limpa e abundante. Agora, o desafio passa do legislativo para o executivo. O sucesso da iniciativa dependerá da fiscalização das contrapartidas e da capacidade do governo de transformar a letra da lei em um ambiente de negócios verdadeiramente favorável. A premissa é verdadeira; resta saber se o resultado final também será.
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