A Rebelião das Máquinas Começou no Brasil?
Parece cena de um futuro distópico, mas está acontecendo agora, nos tribunais de São Paulo. O jornal Folha de S.Paulo, um dos gigantes da mídia tradicional brasileira, declarou guerra à OpenAI, a mente por trás do onipresente ChatGPT. Em uma ação judicial protocolada na última quarta-feira (20), conforme noticiado pelo Olhar Digital, o jornal acusa a big tech de duas infrações graves: violação de direitos autorais e concorrência desleal. A Folha alega que a OpenAI tem usado seu vasto acervo de notícias, incluindo conteúdo exclusivo para assinantes, para treinar seus modelos de inteligência artificial sem pedir permissão e, claro, sem pagar um centavo por isso. É como se um robô entrasse na sua biblioteca, lesse todos os seus livros e depois começasse a vendê-los resumidos na esquina, sem te dar o crédito.
O Fantasma na Máquina: Como o ChatGPT 'Leu' a Folha
A acusação não é baseada em achismos. Segundo os documentos do processo, a Folha de S.Paulo busca provar que seu conteúdo foi sistematicamente 'consumido' pela IA. A evidência mais forte, apontada pela reportagem do Olhar Digital, vem de um repositório no GitHub mantido por funcionários da própria OpenAI. Nesse arquivo, o domínio UOL, que hospeda o site da Folha, aparece listado entre as principais fontes de dados para treinamento. Isso significa que, na prática, todo o conteúdo do jornal estava no 'cardápio' da IA. Para piorar, o jornal O Globo também é citado como fonte de dados no mesmo repositório.
A escala da operação é impressionante. Apenas no mês de julho, a Folha registrou mais de 45 mil acessos de GPT bots ao seu site. Esses 'robôs leitores' ignoram as barreiras digitais, como paywalls, para coletar informações. Taís Gasparian, advogada do jornal, foi enfática ao afirmar que 'há uma nítida prática de concorrência desleal', pois a OpenAI 'dribla os mecanismos do jornal' para distribuir o conteúdo e, com isso, desviar a audiência. Em outras palavras, a tecnologia que deveria proteger o conteúdo é 'solenemente ignorada ou contornada pelo réu', como um replicante de Blade Runner se infiltrando na sociedade.
Um Déjà Vu Tecnológico: O Caso The New York Times
Essa briga não é uma exclusividade brasileira. O processo da Folha espelha uma ação muito similar movida pelo The New York Times contra a OpenAI e a Microsoft em dezembro de 2023, nos Estados Unidos. O jornal americano também acusa as empresas de usarem seu conteúdo sem permissão e pede uma indenização bilionária. Este movimento global indica que estamos em um ponto de inflexão: a imprensa mundial acordou para o fato de que seus valiosos conteúdos, produzidos com alto custo, estão servindo de alicerce para uma indústria trilionária de IA, sem qualquer contrapartida.
A advogada Monica Galvão, também representante da Folha, destacou a importância de proteger os veículos de mídia nacionais diante da 'tendência de concentração do mercado de comunicação em torno das big techs'. A lógica é simples e poderosa: 'esses modelos de IA funcionam às custas dos conteúdos produzidos e custeados pela imprensa, que deve ser remunerada por isso'. A sobrevivência do jornalismo como o conhecemos pode depender do resultado dessas disputas judiciais.
O Futuro em Jogo: Destruição, Indenização e uma Lei no Congresso
Os pedidos da Folha na justiça são drásticos e poderiam criar um precedente monumental. O jornal exige que a OpenAI interrompa imediatamente o uso de seu conteúdo, pague uma indenização por todo o material já utilizado e, o mais cinematográfico de todos, que os modelos de IA treinados com seus dados sejam destruídos. Sim, você leu certo: a petição pede para deletar uma parte do 'cérebro' do ChatGPT.
Enquanto a batalha legal se desenrola, o Congresso Nacional debate o Projeto de Lei (PL) 2.338, que busca regulamentar a IA no Brasil e prevê o pagamento de direitos autorais por conteúdo usado no treinamento de modelos. A OpenAI, no entanto, não está feliz com a ideia. Em entrevista ao jornal O Globo, citada pelo Olhar Digital, Nicolas Robinson Andrade, diretor da empresa para a América Latina, comparou a medida a um imposto sobre cadeiras: 'É como se o Brasil se tornasse o único país do mundo a taxar a fabricação de cadeiras. Aí é natural que as fábricas de cadeiras no futuro não sejam construídas aqui'. A metáfora, porém, deixa uma pergunta no ar: desde quando a matéria-prima de uma cadeira é gratuita e protegida por lei?
O Próximo Capítulo da Saga Humano vs. Máquina
O processo da Folha contra a OpenAI é muito mais do que uma disputa comercial. É o prólogo de uma nova era, onde teremos que definir as regras de convivência entre criadores humanos e criadores artificiais. O jornal afirma que tentou uma negociação amigável no ano passado, mas as conversas não avançaram por 'decisão unilateral do réu', que deixou o último e-mail sem resposta. Agora, o silêncio da OpenAI terá que ser quebrado nos tribunais. O resultado deste confronto não definirá apenas o futuro financeiro de um jornal, mas também quem controlará a narrativa e a informação no futuro que já começou.
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